Raquel Montero

Raquel Montero

segunda-feira, 13 de maio de 2013

"Mensalão"; descortinando as faces de um julgamento - Parte 1



Na Bíblia está escrito que o Pai disse a Jesus; "conheceis a verdade e a verdade vos libertará."
Na Teosofia, Blavatsky propalou que "só deveríamos repassar o que soubessemos ser verdade."
No comunismo, um dos mais antigos comunistas, Lenin, disse que "a prática é o critério da verdade."
No hinduísmo, ensina-se a meditar antes de agir.
No espiritismo, Kardec remete o espírita à frase repetida por Jesus; "conheceis a verdade e a verdade vos libertará".
No Jornalismo uma das premissas para veiculação de qualquer notícia é "ouvir todos os lados".
No Direito preleciona-se que "todos são inocentes até  que se prove o contrário".
A nossa lei maior, que constituiu o Estado brasileiro, a Constituição Federal, estabelece que em qualquer acusação deve haver o contraditório e a ampla defesa, como o mínimo para se tentar conseguir um julgamento justo.
Nesse tom quero falar do julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), divulgado como "julgamento do mensalão". Um julgamento que desde o início foi viciado com parcialidades, contradições e máculas.
Não foi o único caso de corrupção denunciado nos governos civis desde o final da Ditadura Militar, em 1985. Também não foi o único em que políticos usaram recursos públicos e privados para a sustentação de seus esquemas. Ao contrário, em duas décadas tivemos o caso Collor-PC Farias, o golpe do Banco Econômico, o golpe do Banestado, os desvios dos Maluf, o caso do mensalão tucano, o golpe do Opportunity, o golpe da Camargo Corrêa, e tantos outros com características semelhantes: uso de dinheiro público para favorecimento de empresas privadas e pagamentos de propinas a políticos e agentes públicos, com reflexos em sonegação de impostos, evasão de divisas e lavagem de dinheiro ilícito.
Entre tantos casos graves o processo de um suposto mensalão do PT foi o único que foi levado a julgamento. E por que só este caso foi levado à julgamento? E por que neste julgamento, que também deve seguir o princípio da inocência, em que todos são considerados inocentes até que se prove o contrário, condenou-se, sem prova concreta de culpa, José Genoíno e José Dirceu? Por que o caso de um suposto mensalão do PT, que data de 2003, foi levado a julgamento antes do caso de um suposto mensalão do PSDB, que data de 1998?
É a análise dos fatos relacionados à este julgamento que quero desenvolver aqui. Longe do apelo, do sensacionalismo e da manipulação midiática, quero analisar o julgamento conhecido como julgamento do mensalão”. E para isso é necessário esmiuçar os fatos sem parcialidade, sem tendência e sem manipulação. Analisar como quem busca a verdade. E assim fiz. Analisei a peça técnica intitulada pela lei como “denúncia”, oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) ao STF, para acusar os supostos envolvidos no mensalão. Analisei o relatório da Ação Penal 470, feita pelo ministro relator Joaquim Barbosa. Analisei a revisão do processo feita pelo ministro revisor Ricardo Lewandowski. Analisei o julgamento do caso. E por fim, analisei a sentença prolatada sobre o caso.

Cronologia

Em 2005 foi divulgado pela imprensa um vídeo que gravou mediante uma câmera escondida, um funcionário dos Correios recebendo dinheiro para favorecimentos ilícitos nesta empresa pública. O dinheiro seria parte de um esquema de arrecadação ilegal para o PTB, presidido por Roberto Jefferson que, pressionado pela mídia e pela iminência de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), procura o jornal de maior circulação do país e aponta a cúpula do PT como principal interessada e responsável por um esquema que garantia “mesadas” a deputados em troca de apoio no Congresso.
Em 2007, o Ministério Público Federal (MPF) denuncia ao STF um esquema de “caixa dois”, lavagem de dinheiro e peculato organizado e implementado pelo empresário Marcos Valério, mesmo articulador do mensalão envolvendo o PT. Neste caso, o beneficiário maior era Eduardo Azeredo, candidato à reeleição ao governo de Minas Gerais, pelo PSDB, em 1998.
Embora este caso, envolvendo o PSDB, seja de 1998, e o caso envolvendo o PT, seja de 2003, o caso do PSDB ainda aguarda julgamento no STF, e o caso do PT já foi julgado pelo STF. Por que julgou-se primeiro o fato menos antigo? Por que o STF não julgou os dois casos juntos?
Além disso, o STF desmembrou o processo mineiro permitindo que acusados sem foro privilegiado fossem julgados inicialmente pelas instâncias inferiores do Judiciário, o que não ocorreu com o chamado mensalão do PT, tirando de vários réus a possibilidade de qualquer recurso. Por que essa diferença?
Por que a diferença midiática conferida aos dois casos? Enquanto o mensalão petista virou quase um folhetim jurídico, com ampla cobertura jornalística da Rede Globo, que dedicou blocos inteiros dos seus principais telejornais para noticiar o julgamento do mensalão petista em pleno período eleitoral, o mensalão tucano simplesmente não existe para a grande mídia.
Esta omissão nos remete ao caso do livro “A Privataria Tucana”, do jornalista Amaury Ribeiro Júnior, que abordou os esquemas de corrupção nas privatizações ocorridas durante o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso (FHC). O livro não foi citado pelos telejornais da Rede Globo, embora tenha ficado no topo das listas de livros mais vendidos do país durante várias semanas.
Embora tenha sido antecedido por muitos outros escândalos de corrupção, o chamado mensalão do PT, foi o único caso de corrupção a ser julgado. Muitos casos anteriores nunca foram levados aos tribunais por negligência do MPF. É exemplo dessa negligência, um caso emblemático ocorrido durante a gestão do PSDB na Presidência da República (1995-2002), em que o Secretário-Geral do Presidente FHC, foi alvo de diversas denúncias que apontavam seu envolvimento com o juiz Nicolau dos Santos Neto, coordenador de um esquema de corrupção que teria desviado mais de 220 milhões de reais dos cofres públicos para a montagem de “caixa dois” para a reeleição de FHC. Todavia, a maior parte das denúncias recebidas pelo MPF na época, foram arquivadas ou engavetadas. As acusações recaíam sobre 194 deputados, 33 senadores, 11 ministros e 04 sobre o próprio FHC.
No mesmo ano da divulgação do vídeo aludido, em 2005, uma CPI foi instalada para apurar os fatos. Neste momento também, a Polícia Federal prende quatro suspeitos de participação na gravação.

Raquel Bencsik Montero


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